quarta-feira, 25 de junho de 2008

Cigarros – por Said Leoni (parte 2)

Estava com medo, seus sentidos entorpecidos pelo álcool só fortaleciam esse sentimento. Seus olhos nunca paravam em um ponto, olhava para os lados como se isso facilitasse um possível contra-ataque caso fosse agredido repentinamente, pensou em dobrar uma esquina, mas não o fez, não havia se acostumado com o caminho para a casa nova, temia se perder e com isso facilitar a ação do bandido. Manteve o passo firme, o mais reto possível. Queria acender mais um cigarro, restaram apenas dois, pegou um e guardou o outro no bolso, jogou o maço na calçada. Logo o ouviu sendo esmagado.
Cinqüenta segundos depois, a perseguição o torturava. Sentiu a garganta ardendo – “Meu deus!” – havia vomitado na festa, não lembrava. Não entendia porque não dormira na casa de Jorge, bebera exageradamente, passara mal, Jorge era seu amigo, deveria acolhê-lo. O frio aumentou, agora um vento cortante vinha em suas costas, tremia quando a rua tornou-se ladeira, subiu.
O cara que beijara Marina não era bonito e não era feio, normal. Não conhecia, sabia que ele dormiria na casa de Jorge, por isso não quis dormir lá, tinha medo de sentir raiva, não se controlar. Jorge pediu que ficasse, não ficou, e agora não tinha mais os documentos, o dinheiro, a carteira. Se morresse estaria sem identidade, seria um indigente, um ninguém. Em um minuto estava no topo da ladeira.
O vento parou de soprar, estagnou, a rua continuava, agora plana, não conseguia enxergar o fim. Tentava manter o cigarro aceso, o fumo acabara, jogou-o para frente, pisando-o logo depois. Voltou a lembrar da festa, lembrou de Jorge levando-o para o quarto, ficou no corredor até Jorge destrancar a porta, quando a abriu, uma surpresa – “Não!” – na sua frente como animais, Marina e o amante, nus – “Como eu pude esquecer?” – indagou, alterou-se por um momento, ficou vermelho, esqueceu completamente o perseguidor, porém isso não afetara sua velocidade, ao contrário, andava mais rápido.
Pensamentos diversos invadiram sua mente, imagens da Marina imaculada que amava, misturadas a imagens da Marina que desconhecia, possuída como um animal. Começou a tremer – “Ela sorria, ela sorria.” – lembrou, odiou, ficou apavorado, se morresse nunca possuiria Marina, se morresse nunca beijaria Marina. A idéia da morte lhe fez lembrar da perseguição, os passos haviam distanciado um pouco, não muito, agora pareciam estar a três metros de distância, dois minutos depois a rua tornava-se outra ladeira, agora descia.
(continua...)

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